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Na reta final de ‘Amor Perfeito’, atriz celebra maior espaço para representatividade na tevê

A sensibilidade de Juliana Alves estava aguçada ao receber o convite para “Amor Perfeito”, atual novela das seis. A atriz, que estava em contato com o diretor André Câmara, não precisou de muitas informações sobre sua personagem para aceitar a empreitada que vem vivendo há quase cinco meses. Na produção de época, ela interpreta a moderna Wanda, que carrega uma série de discussões sociais imprescindíveis para a atualidade. “Nem soube qual era a personagem, mas sabia que seria especial. A Wanda é uma personagem muito rica de contexto social. Muito feliz de participar de um projeto que está provocando mudanças e que traz um Brasil bem real”, explica.
Em “Amor Perfeito”, Wanda é esposa do promotor Sílvio Pacheco, de Bukassa Kabengelle. Uma mulher moderna, de espírito cosmopolita, é dona da loja A Brasileira Elegante, que oferece, entre seus artigos, produtos femininos ousados para a mentalidade interiorana da época, como tops, calças compridas e terninhos. Roupas que ela mesma não se furta a usar, chegando a causar um choque entre as figuras mais conservadoras da cidade, como o prefeito Anselmo Evaristo, de Paulo Betti. “Existiam muitas mulheres à frente de seu tempo, mas elas foram apagadas da história. Me inspirei em muitas mulheres negras poderosas”, ressalta.

Sua última novela havia sido “Salve-se Quem Puder”, que, inclusive, teve a exibição interrompida por conta da pandemia de Covid-19. Como chegou o convite para retornar aos folhetins em “Amor Perfeito”?
Foi um convite que veio através do André Câmera, que assina a direção artística da novela. Nos conhecemos há muito tempo e admiro muito a carreira dele. A forma como ele dirige é muito sensível, humana e tem uma visão de mundo muito boa. Ele procura contribuir para as transformações sociais através dos trabalhos dele. A trama de “Amor Perfeito” é, na verdade, nosso primeiro trabalho juntos. Mas assim que soube do convite, aceitei. Só depois fui saber da personagem.

Por quê?
Eu sabia que seria um trabalho especial. Amei a Wanda. É uma personagem muito rica de contexto social. Nos próximos capítulos, vamos ver mais conflitos dela. Muito feliz porque “Amor Perfeito” é uma novela que está provocando mudanças. Uma novela de época que retrata o Brasil de uma forma bem real. A gente estava muito preso a um olhar que invisibilizava a comunidade negra naquela época.

A novela traz uma elite negra para o centro de uma história de época. Quais bons reflexos essas discussões podem reverberar na sociedade atual através da tevê aberta?
Trazer essa realidade para a tevê aberta é importantíssimo. A tevê aberta ainda dita muito do comportamento da gente. A gente só consegue transformar a partir de experiências que vêm a partir de um olhar. Então, essa novela reproduz realidades que foram invisibilizadas. E, com imagens, a gente faz as pessoas pensarem. É uma forma de transformar o imaginário social através de histórias que o público gosta. Mudar comportamentos e escolhas das pessoas.

Como você vê esse movimento de maior protagonismo negro nas novelas e produções brasileiras?
A carreira artística é bem difícil, né? A gente vive essa expectativa de poder ou não fazer algum personagem. É uma carreira concorrida. As oportunidades são menores do que as pessoas disponíveis e talentosas para trabalhar. Os artistas negros, de uma forma geral, percebiam que essas oportunidades eram ainda menores. Tudo isso agravava a nossa escolha de viver dessa arte. Essas oportunidades cresceram de uns anos para cá. A gente trabalha e deseja que as oportunidades contemplem a realidade diversa do Brasil. Mais justa com a nossa cultura, arte e realidade. É muito emocionante vivenciar essa mudança diante dos nossos olhos.

Como assim?
Há alguns anos, a gente vive uma melhora significativa no debate. As criações negras têm tido mais escuta. As mudanças de ponto de vista são necessárias. Temos mais pessoas envolvidas na desconstrução desse pensamento colonizado. Nossos autores têm esse olhar. Há um autor negro no projeto. Essa novela já está realizando mudanças. A gente sabe que há uma grande jornada pela frente. Estamos vivendo um ano de continuidade do protagonismo negro e do ponto de vista negro dentro das narrativas. Esse momento já está impactando nossa história. Lógico que há muitas questões estruturais ainda para trabalhar, equívocos e hipocrisias que não podemos negar e fingir que não vemos. Temos trabalhado e refletido. Eu procuro ter um posicionamento efetivo sobre essas temáticas.

Na história da novela das seis, a Wanda é uma mulher à frente de seu tempo. Como foi seu processo de construção para viver uma mulher tão moderna na década de 1940?
Tive muitas conversas com a direção e a preparação. Fiz estudos de análise histórica dessa sociedade desse período. Há evidências e pesquisas que mostram que essas mulheres à frente do tempo existiam, mas não se tornavam pessoas com notoriedade social ou não estavam nos livros de história. Me inspirei em muitas mulheres negras poderosas.

A Wanda é dona de uma loja de roupas femininas e está sempre usando peças pouco usuais para mulheres da época, como tops, calças compridas e terninhos. Qual era a sua relação com a moda antes de integrar o folhetim?
Minha relação com a moda vem a partir do meu trabalho. Tinha contatos no meio da moda, mas não tinha uma relação tão íntima com a moda. Por muito tempo, eu pensei que esse universo não condizia com a minha realidade.

De que forma?
A indústria da moda exclui um pouco as pessoas que não estão dentro de um padrão. Tem muito marketing em torno da representatividade, mas o mercado, na prática, deixa a desejar nesse sentido. Não é inclusivo como diz ser. Mas a gente vê uma galera mais diversa que pensa e realiza o negócio. Atualmente, olho para o cenário da moda e fico mais animada. Recentemente, estive na semana de moda de São Paulo e tive a alegria de encontrar algumas pessoas e trocar ideias. Fiquei com uma esperança boa dentro de mim.

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